Sororidade: Carolina Maria de Jesus
- cultivandomundos
- 6 de mai. de 2021
- 3 min de leitura
Atualizado: 22 de mai. de 2021

Convidamos os amigos para a seguinte reflexão: duas crianças que estudam na mesma sala, do mesmo colégio, têm as mesmas oportunidades de aprendizado?
Vamos considerar duas crianças de condições de vida diferentes, onde uma delas vive em um ambiente precário. A criança hipotética, não dormiu bem, visto que, durante a madrugada na comunidade onde mora, houveram confusões típicas envolvendo tiros. Acordou em sua casa que a geladeira não é abastecida de forma suficiente. E ao fim, caminhou alguns quilômetros para chegar à escola.
Por outro lado, a outra criança, usufrui dos direitos básicos que todos deveriam ter acesso.
Então indagamos se estas duas pessoas têm a mesma oportunidade social.
O exemplo que estamos apresentando aqui, envolve a percepção de que a genialidade não tem local pré-estabelecido para existir.
Portanto, à medida em que excluímos uma parte da sociedade do direito de compartilhar as suas ideias, perdemos consideravelmente as potencialidades destes indivíduos.
Carolina Maria de Jesus era negra, pobre e periférica.
Tomava seus sustento através da catação de lixo. Sustento, tendendo um pouco ao otimismo. Enfrentou inúmeras dificuldades de vida. Uma trajetória muito difícil.
Nasceu no ano de 1914, em uma comunidade rural em Sacramento, Minas Gerais. Filha de pais analfabetos, cursou até o segundo ano do ensino fundamental, ou seja, dois anos de estudo escolar. Em 1937, o ano em que perdeu a sua mãe, aos 33 anos desempregada e grávida foi para São Paulo onde se instalou na primeira maior favela de São Paulo, a Canindé. Logo, conseguiu um emprego na casa do cardiologista Euryclides de Jesus Zerbini (precursor da cirurgia de coração no Brasil) o que permitia a Carolina ler os livros da biblioteca da casa nos dias de folga. Como tinha muito prazer e alegria em ler e escrever, ela somava grande número de escritos em forma de diário falando de sua vida e dos seus vizinhos na comunidade.
“É quatro horas. Eu já fiz almoço - hoje foi almoço. Tinha arroz, feijão e reponho e linguiça. Quando eu faço quatro pratos penso que sou alguém. Quando vejo meus filhos comendo arroz e feijão, o alimento que não está no alcance do favelado, fico sorrindo a tôa. Como se eu estivesse assistindo um espetáculo deslumbrante (p.44).”
Uma parte destes diários, rendeu o seu primeiro livro “Quarto de despejo: Diário de uma Favelada” que foi um grande sucesso. A primeira edição imprimiu 10000 exemplares que se esgotaram em apenas uma semana. A obra foi traduzida em 13 línguas e ultrapassou um milhão de cópias.

Os seus vizinhos da favela, muito se incomodaram com os relatos sinceros da escritora tornando ela e sua família pessoas indesejadas no local.
Recebendo alguma parte das vendas da sua obra, ela leva a sua família para morar em um bairro de classe média. O que causou incômodo agora para a nova vizinhança que os rejeitavam desta vez, pela sua origem muito humilde.
Sentindo-se em uma exclusão contínua da sociedade acaba indo morar em uma cidade do interior e ali permaneceu até a sua morte em 1977. Publicou ainda em vida os livros “Casa de alvenaria”(1961), “Pedaços de Fome” (1963) e “Provérbios” (1963) não tendo os 3 o mesmo êxito do seu primeiro.
Por mais que esta pessoa tão especial lutasse contra esta massiva pressão social, os obstáculos não paravam de crescer diante dela. Não podemos romantizar a ideia de que é necessário o esforço pessoal para ter como consequência direta a vitória. Faz-se necessário e urgente que todos tenham as reais oportunidades na vida tendo primeiramente os seus direitos essenciais garantidos.
“O Brasil precisa ser dirigido por uma pessoa que já passou fome. A fome também é professora. Quem passa fome aprende a pensar no próximo, e nas crianças”
E neste contexto, podemos introduzir a ideia de equidade, que tende a equiparar as oportunidades a partir da necessidade de cada um e no caso da nossa querida Carolina, a equiparação deveria se comprometer com a dívida histórica que o Brasil tem com seus filhos marginalizados.
Carolina Maria de Jesus Presente!
A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) concedeu o título de Doutora Honoris Causa à escritora Carolina Maria de Jesus. A homenagem foi feita no dia 25 de fevereiro de 2021.
Para saber mais:
https://ims.com.br/exposicao/carolina-maria-de-jesus-ims-paulista/
As citações são do livro Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada.
Comments